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"É NATAL, MAS NÃO PRECISA SER ÓBVIO!"

Depois de tantos séculos comemorando a data, fico me perguntando o que ainda falta falar sobre o Natal. Acho que nada mesmo. O tema é "batido", desgastado e, até piegas como disse um amigo. Mas, justamente por isso, me propus um desafio: fazer dez postagens sobre o Natal, que tenham um enfoque original, que fujam do lugar-comum. Procurei por textos, fotos, charges, vídeos, enfim, tudo que possa ajudar a "oxigenar" a data. O mais curioso é que, na minha primeira busca, (comecei pelas crônicas) encontrei esse texto do Veríssimo que expõe exatamente essa dificuldade em buscar originalidade num tema tantas vezes antes visitado.    
Não sei se conseguirei cumprir o meu desafio de forma satisfatória, mas que Luis Fernando Veríssimo, com maestria, deu um drible na mesmice quando escreveu essa crônica, não há dúvidas. 


NATAL (Por Luis Fernando Veríssimo)

Natal é uma época difícil para cronistas. Eles não podem ignorar a data e 
ao mesmo tempo não há mais maneiras originais de tratar do assunto. 
Os cronistas, principalmente os que estão no métier há tanto tempo, que 
ainda usam a palavra métier – já fizeram tudo que havia para fazer com o 
Natal. Já recontaram a história do nascimento de Jesus de todas as formas: 
versão moderna (Maria tem o bebê numa fila do SUS), versão coloquial ("Pô, 
cara, aí Herodes radicalizou e mandou apagá as pinta recém-nascida, baita 
mauca"), versão socialmente relevante (os três reis magos são detidos pela 
polícia a caminho da manjedoura, mas só o negro precisa explicar o que tem 
no saco) versão on-line (jotace@salvad.com.bel conta sua vida num chat sitc), 
etc. 


Papai Noel, então, nem se fala. Eu mesmo já escrevi a história do casal 
moderno que flagra o Papai Noel deixando presentes sob a árvore de Natal, 
corre com o Papai Noel e não conta nada da sua visita para o filho porque 
querem criá-lo sem qualquer tipo de superstição várias vezes. 
Poucos cronistas estão inocentes de inventar cartas fictícias com pedidos 
para o Papai Noel: patéticas (paz para o mundo, bom senso para os 
governantes), políticas ("Só mais um mandato e eu juro que acerto, ass. 
Fernando") ou práticas ("Algo novo para escrever sobre o Natal, por amor de 
Deus!"). 


Já fomos sentimentais, já fomos amargos, já fomos sarcásticos e 
blasfemos, já fomos simples, já fomos pretensiosos – não há mais nada a 
escrever sobre o Natal! Espera um pouquinho. Tive uma idéia. Uma reunião de 
noéis! Noel Rosa, Noel Coward e Papai Noel. Acho que sai alguma coisa. 
Noel Rosa, Noel Coward e Papai Noel estão reunidos... onde? Na mesa 
de um bar? Papai Noel não freqüenta bares para não dar mau exemplo. Pelo 
menos não com a roupa de trabalho. No Pólo Norte? Noel Coward, 
acostumado com o inverno de Londres, talvez agüentasse, mas Noel Rosa 
congelaria. Não interessa onde é o encontro. Uma das primeiras lições da 
crônica é: não especifica. Noel Rosa, Noel Coward e Papai Noel estão reunidos 
em algum lugar. Os três conversam. 


Noel Rosa – Ahm... Sim... Hmm... 
Noel Rosa diz o quê? 
Noel Rosa – E então? 
Noel Coward e Papai Noel se entreolham. Papai Noel cofia a barba. 
Ninguém sabe, exatamente, o que é "cofiar", mas é o que Papai Noel faz, 
enquanto Noel Coward olha em volta com evidente desgosto por estar em 
algum lugar. Preferia estar em outro. A todas essas eu penso em alguma coisa 
para eles dizerem. 
Noel Roas (tentando de novo) – E aí? 
Papai Noel – Aqui, na luta. 
Noel Coward – What? 
Esquece. Não há mais nada a escrever sobre o Natal. 
Salvo isto, se dão vênia: que seu Natal em nada lembre o da Chechênia. 



Que suas meias se encham de metais vis desde que não sejam guaranis. 
Que sob a árvore enfeitada o grande embrulho com seu nome seja... 
Meu Deus, a Paola pelada! 
Que em nenhum momento do rebu alguém faça piada com o tamanho do 
peru. 
Que em alegre bimbalhada os sinos anunciem ao mundo que está saindo 
a rabanada. 
E cantem os anjos, a capela que o Cristo vai nascer assim que acabar a 
novela. 

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