FIM DA VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER/ POST DE HOJE: "ISSO NÃO É UM CONVITE PARA ME ESTUPRAR!" ( POR RENATA LIMA)
O post de hoje do ativismo online pelo #FimDaViolênciaContraMulher é de Renata Lima. Ela escreveu esse post para o site do Blogueiras Feministas, e eu achei muito interessante o seu relato como delegada, do atendimento de dois casos de mulheres vítimas de estupro. Um crime tão bárbaro onde, a mulher além de ser a vítima, carrega consigo o estigma de ter sido também a provocadora do crime. Como se o fato de usar roupas curtas, dançar sensualmente ou até mesmo estar bêbada, abrisse algum precedente para que sejamos estupradas. Vamos ao texto, porque a Renata pode falar com mais propriedade do que eu:
O título desse post é a tradução do site: “This is not na invitation to rape me“. Encontrei-o no começo do ano passado, quando fiz o atendimento de um caso de estupro. Foi uma peleja, foi atípico e foi o clássico “date rape” mas, não temos essa figura e o sujeito poderia ficar impune se não fosse o trabalho de interpretação e de hermenêutica que fizemos para demonstrar que a violência psicológica também é violência, conforme prevê a lei Maria da Penha.
Quase um ano depois do fato, consultei o site do Tribunal e vejo que o Ministério Público ofereceu denúncia e ela foi recebida. A jovem vítima deste crápula, eu espero que fique bem, que a catarse de haver ido até o final a ajude a se recuperar. O mesmo não posso dizer de outra vítima, esta no começo deste ano. Registramos a ocorrência, mas depois a atendente me disse que o companheiro da vítima estava do lado e o tempo todo ficava culpando… um doce para quem acertar… isso mesmo! O “companheiro” culpava a vítima. Que saiu de casa após brigar com ele e havia bebido. Logo, à noite, se foi presa fácil de um predador, de quem é a culpa??? Lógico que não é do animal irracional que tenta estuprar uma mulher semi-desacordada, mas da própria mulher.
A gente lê sobre isso, escreve sobre isso, vive essas situações. Mas o mais triste é que enquanto por uma vítima eu consegui fazer alguma coisa, a parte que me cabia, pela outra não consegui sequer convencê-la de que não, ela não é “estuprável” por haver se excedido na bebida, brigado com o companheiro e saído para a rua, em um horário tardio, para tentar espairecer.
Vão me dizer que se fosse um homem aconteceria a mesma coisa. Sim, a mesma coisa. Antes de tentar estuprá-la, o agressor a derrubou e roubou o dinheiro que estava com a vítima. Em seguida, decidiu tirar as roupas da mulher, e, no meio da rua, descer as próprias calças, em busca de penetração e da satisfação de seu senso distorcido de prazer. Prazer que não é necessariamente sexual. É um prazer que em geral decorre da sensação de poder, de se impor sobre a vítima. Pouco provável que um assaltante fosse tentar estuprar um homem semiconsciente, da mesma forma que tentou estuprar uma mulher. (salvo se o homem semiconsciente for um homossexual ou uma travesti, e isso for de conhecimento do agressor, muito comum ocorrer!)
Agora, me pergunto: o que faz com que alguns homens, desde jovens, tenham a capacidade de considerar as mulheres como presas? Como objetos ao seu dispor, especialmente quando vulneráveis, fragilizadas? Vemos depoimentos de jovens e, mesmo os que buscam outras possibilidades de vivência, sem as limitações do machismo, confessam que muitas vezes reincidem em brincadeiras ou comentários que não escondem o conteúdo misógino, homofóbico e preconceituoso. (...)
E, entre todas as formas de preconceito contra mulheres, as mais ofensivas são as que fazem piada com assunto sério.
Estupro é assunto sério.
Assassinato é assunto sério.
A gente pode brincar com o sexo (deve! Sexo é lúdico, é prazer, é alegria, ou deve ser.)
A gente pode brincar com a morte? Sim, A morte faz parte da vida, fazer piadas com a morte é uma tentativa de negar sua existência? Pode ser.
Mas piadas e gags com assuntos como estupro, que tem uma das maiores taxas de subnotificação entre todos os crimes, a maior entre os crimes graves, é como negar a gravidade do fato, a gravidade do trauma, é legitimar a conduta do agressor, do predador, e objetificar, de novo, a vítima. Fazendo-a, de novo, vítima.
Não, o fato de eu ser mulher não é um convite ao estupro.
Não, o fato de eu te beijar ou algo mais, não é um convite ao estupro.
Não, o fato de eu beber não é um convite ao estupro.
Está na hora de parar, não está?
(Renata Lima) |
(Leia o post na íntegra, aqui)
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